sexta-feira, janeiro 19, 2007

Contingências da Fortuna e o dom da Virtú: na política e no amor

Maquiavel deveria ser lido por todas as almas vivas nesse planeta. Justamente porque Maquiavel, essencialmente em O Príncipe, serve para explicar absolutamente tudo que possa acontecer em sua vida. Pois sim, se não servir para explicar tudo, servirá certamente para orientar algumas estratégias.
No já citado O Príncipe, Maquiavel parte da premissa básica de que a moral política é diferenciada de outras espécies de moral, e portanto possui uma lógica própria.Sendo assim, o governante, ou príncipe, precisa jogar esse jogo, se deseja se manter no poder. Limitar-se pela moral social,ou religiosa, levará qualquer governante ao fracasso. O cara que governa deve, então, submeter-se à táticas que seriam moralmente condenáveis pela sociedade mas que, sob a ótica da moral política, são perfeitamente aplicáveis. A moral política baseia-se no sucesso: deu certo, é bom; deu errado, condene-a. Foi aqui, em Maquiavel, que os políticos aprenderam que dar ouvidos a protestos da sociedade civil é uma tática muito mais eficiente do que preocupar-se de fato com os motivos deles: a sociedade normalmente fica satisfeita em apenas ser ouvida. Sim, meus caros, foi em Maquiavel que a coisa começou a desandar...Mas esse não é o ponto aqui. Vamos então ao ponto. A correlação com fortuna e virtú é um aspecto interessante dessa teoria maquiaveliana. Virtú, a capacidade do político lidar com os intempérios das circunstâncias, é uma habilidade que certamente não é dispensável no caminho para o sucesso. Maquiavel a trata como algo inato. É como se fosse um dom. Nesse ponto, fica dificil não lembrar: como o nosso presidente tem virtú, não acham? A Fortuna, por sua vez, significa sorte mesmo. O político tem que ter sorte, ou seja, as circuntâncias têm que jogar a favor dele, por que se não, não há virtú que dê jeito...
Bom, sem mais demoras nessa parte, posto que é fácil perder o foco nessa brincadeira de blogar. As estratégias que Maquiavel apresente em seu livro partem da premissa - igualmente básica - de que o príncipe quer, mais que ninguém, se manter no poder. Querendo isso mais que ninguém, ele vai aplicar corretamente sua virtú, fazendo a fortuna trabalhar ao seu favor.
Imaginem agora um individuo, do sexo masculino, solteiro nessa terra quente chamada Salvador. Ele acorda todos os dias e se olha no espelho. Ao olhar-se, ele afirma: "que maravilha! tenho o dia livre, pois estou sol-tei-ro!" Tudo que ele quer é continuar solteiro, ele quer agarrar essa liberdade e não solta-la tão cedo. Ah, mas isso não é nada fácil. Diria que uma dose de virtú e uma ajudazinha da fortuna são fatores determinantes na vida desse pobre individuo. Agora vamos aos porquês...
Primeiro, porque ele quer ser solteiro, mas nunca ficar sozinho. A necessidade de enamorar-se vez ou outra é bem humana, como já disse... quem disse isso mesmo? Enfim, ele quer, ele vai à luta. Ele (as feministas vão cair da cadeira) caçam. Sim, caçam. Ou alguém vai ter coragem de me dizer que festas como o Bonfim Light não são verdadeiras caçadas? As estratégias de caça não estão ao alcance de todos. Seria preciso ressuscitar Maquiavel para que ele nos explicasse como aprender a lidar com esse tipo de situação.. Ah, ele nunca faria isso. Virtú não se ensina...
Segundo, porque ele quer enamorar-se, mas jamais namorar! Ai, depois que ele se dá bem na caça, vem o problema: a moça gostou demais dele. Gostou mais do que ele queria. Como dizer a ela que ele não está interessado em se envolver, mas aceita a idéia de vê-la vez ou outra, para conversarem e, quem sabe...Ou seja, virtú, sempre virtú!
Terceiro, e mais importante, a fortuna. Como fazer a fortuna alinhar-se aos seus planos? Sim, pois, de fato, o inverso do último fator acontece. Não necessariamente o inverso, mas uma situação diferente: o individuo se envolve mais do que queria, também. Nesse caso, a fortuna trabalha contra suas intenções. Se envolver não faz parte da intencionalidade do individuo, e sim da estrutura que o cerca. Quando a fortuna age contra, diria Maquiavel,é porque o príncipe não era merecedor do sucesso, pois só a junção da virtú com a fortuna o garantiria. Desta forma, cai o príncipe, e cai o individuo solteiro. Esse último, imbecilizado pela envolvimento desafortunado, começa a achar que nunca quis ser solteiro. Imagine, toda aquela liberdade, toda aquele mundo a descobrir.. O imbecil começa a achar tudo inútil. Percebe que toda a série de estratégias que tentou aprender, toda a virtú para o sucesso na solteirice que ele pensou ser inata, tornam-se desgraçadamente inúteis quando o objetivo se esvai. Cai o príncipe, cai o solteiro. Diferente do primeiro, o segundo rí a toa ao notar que fora abandonado: por Maquiavel, pela fortuna e pela virtú...