quinta-feira, agosto 31, 2006

O bom e velho amor...

Falemos de amor!
Sobre esse assunto não seria necessário descrever a experiência cotidiana que me motivou a escrever sobre o tema - na verdade desabafar -, já que o amor é uma categoria onipresente na nossa vida diária. Mas, para que não me entendam mal, digo-lhes que pensei em escrever algo ao ouvir a música que reproduzo abaixo:

É Festa
Intérprete: Simone
Composição: Ivan Lins e Paulo Cesar Pinheiro
Quando a gente ama faz qualquer loucura
Só se pensa em cama, se perde a censura
A alma desembesta, é festa, é festa, é festa, é festa...
Até quando o sol raiar
Quando a gente gosta, gosta de anarquia
Anda descomposta, fica mais vadia
Faz o que não presta, é festa, é festa, é festa, é festa...
Até quando o sol raiar
Ah! Vale tudo na hora da gente amar
E a gente diz coisas que nem ia imaginar
Me lambe, me morde, me arranha, me bate
Ah! Isso não tinha que acabar
Quando a gente ama, ri de orelha a orelha
Faz qualquer programa, o que der na telha
Canta até seresta, é festa, é festa, é festa, é festa...
Até quando o sol raiar
Quando a gente gosta, some do analista
Topa até proposta de ser naturista
Ri de quem contesta, é festa, é festa, é festa, é festa...
Até quando o sol raiar
Ah! Vale tudo na hora da gente amar
E a gente diz coisas que nem ia imaginar
Me lambe, me morde, me arranha, me bate
Ah! Isso não tinha que acabar
Quando a gente ama anda mais risonha
Vira mulher-dama, fica sem vergonha
Traz isso na testa, é festa, é festa, é festa, é festa...
Até quando o sol raiar
Quando a gente gosta claramente assume
E se alguém encosta morre de ciúme
Paga até sugesta, é festa, é festa, é festa, é festa...
Até quando o sol raiar

Bonita poesia, não?
Esse amor descrito é um tipo ideal, no sentido weberiano, e um tipo ideal, no sentido normativo, de juízo de valor, da nossa sociedade. Apesar do consumismo, da ênfase no materialismo, todos nós utilizamos o amor como uma categoria referencial nas nossas vidas, ainda que essa referência possa ser tomada negativamente. Entretanto, como qualquer tipo ideal, no sentido weberiano, esse amor descrito na música não existe em seu estado puro na realidade, ou seja, esse amor, que pelo menos a maioria de nós gostaria de sentir, nunca existiu, não existe e não vai existir. Se chocaram? Eu pareço um pessimista, mas não sou. Essa assertiva tem uma explicação muito simples e, nesse momento, esqueço o pretenso sociólogo, antropólogo ou cientista político ou qualquer coisa que for. Falo, nesse momento, como um ser moral e normativo, no sentido do "dever ser", que sou. Esse tipo ideal, no sentido moral agora, de amor não se tornará realidade pois nos esforçamos tanto para alcançá-lo e para sermos felizes, que nunca o seremos. Vivemos quase que obrigados a sermos felizes e a amar, tanto que quem nunca amou, ou acha que nunca amou, ou qualquer coisa que isso queira dizer, se sente excluído da sociedade, um ser diferente, digno de pena. Um outsider do amor, não é uma coisa engraçada? Mas, quem inventou que devemos ser felizes e amar? Putz, quem foi que nos obrigou a essa corrida tão infeliz e dolorosa? Se sofremos tanto na busca de amar e de ser feliz, não era mais lógico que deixássemos de buscar e, logo, seríamos feliz, porque não sofreríamos? Mas, calma. Estamos ainda no meio da digressão. Passando da busca incessante pelo amor, chegamos ao estágio em que o amor já foi encontrado. Pensariam alguns, que ótimo, agora já posso ser feliz. Mas não, o amor, geralmente, lhes traz mais problemas e sofrimentos do que felicidades, ou pelo menos, a felicidade nunca é plena e constante, é fugaz e incipiente. Só se percebe que estava feliz, quando a felicidade já passou e se está sofrendo novamente. Nunca conseguimos ser felizes no amor, porque esperamos tanto por esse momento que nunca estamos satisfeitos com o resulto. Mas o amor, já diria o poeta que eu não sei quem é e não sei se é poeta ou se é fruto de filosofia de botiquim, não é amor se não houver sofrimento. Eu hein, o amor é mórbido... e complicado. Até escrever sobre ele deixa a gente triste e confuso. Mas, enfim, cheguei a uma conclusão: o amor foi inventado para que sofrêssemos e não que possamos ser felizes, ou melhor, o amor nos deixa felizes, ao nos fazer tristes e, nesse tempo, ocupados com nossos sentimentos particulares - felicidade, amor, sofrimento, desventura, tristeza, raiva, ódio, etc. -, vamos densenvolvendo o nosso individualismo, a obra prima da modernidade ocidental!

2 Comments:

Blogger Victor Scarlato said...

Meu caro e fustigado Arantes,

Se pensarmos que todas as coisas supostamente nascidas para o bom e para o belo nos fazem apenas "felizes", estaríamos fadados ao medíocre. Seríamos apenas seres que passeiam indefinidamente e de modo muito ingênuo sobre a terra.

Pensemos o seguinte: todo o belo discurso sobre um ser altruísta não esconde um ser egoísta, por si só? Por mais que essa assertiva já seja formulada, não parece que a realidade do senso comum é tão rasteira, como nesse caso. Podemos pensar, e assim prefiro, como Nietzsche, o ser humano é um ser egoísta no seu percurso existencialista.

Você bem sabe que não sou como você, um otimista. Estou preenchido por um pessimismo crescente. E, observando a realidade social durante todos as noites, este fato só faz piorar. E não somente na vida social, na vida pessoal, ou sentimental, o nosso caminho é apenas um emaranhado de clichês. Por mais que tentemos nos livrar, eles batem à nossa porta. Como você bem colocou, a poesia de Ivan Lins é típica. Mas, como poderíamos viver sem essas ilusões. Não gosto de pensar que as coisas somente boas, ou que nos causam sensação de prazer, sejam aquelas que devem reinar em nós. Uma vez que algo nos causa dor, em relação ao amor, é porque depositamos uma intensa fé naquele ser.

E, foi como eu te falei, se você espera boas retribuições, faça com que elas se efetivem. De nada adianta ficar esperando o dia no qual o ser amado chegue e realize o que você sempre sonhou. E, aqui, permita-me ser redundante, detalhes mínimos conseguem fazer que isso aconteça. Ou, como se diz, toda ação provoca uma reação.

Por fim, apesar de ser um descrente neste mundo, sem esta esfera de ilusões, não sobreviveríamos. Como poderia se dar um relacionamento? No entanto, lidar com esta dinâmica dúbia é algo que os poetas traduzem magistralmente em palavras doces, amargas, encourajadoras, pessimistas...

10:13 PM  
Anonymous Anônimo said...

Não quero ilusão, amor ou felicidade. Basta-me o cotidiano medíocre.

11:26 PM  

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